segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Briga de Foice (16,17 e 18)

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16
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Delegado Freitas está nervoso com um novo fragrante. Se pudesse colocaria todos os marginais na cadeia. O rapaz está assustado, era primeira vez que tinha sido preso na vida. Ele entra na sala do delegado, está com mais medo do pai, quando ficar sabendo do ocorrido, do que pela possibilidade de ficar alguns anos preso. Senta na cadeira, delegado Freitas pega um copo de café, senta-se na sua frente. O rapaz foi pego roubando um carrinho de mercado cheio de compras, a mulher distraída, enquanto abria o porta mala do carro, não viu o sujeito chegar de mansinho e sair correndo com toda mercadoria.
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Por sorte da mulher, e azar do ladrão; dois policiais viram tudo. Pegaram o cara pelo colarinho, puseram no camburão, devolveram o carrinho de compras para a madame. Uma caixa de leite, um pote de manteiga, farinha de rosca, dois iogurtes desnatados, um pacote de fraldas tamanho M, pudim; uma caixa de sabão em pó, duas latas de leite condensado e uma vassoura.
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“Acha que conseguiria correr com aquilo tudo por muito tempo?”
“Não senhor”
“O que deu na sua cabeça?”
“Nada, não, senhor”
“Aquela porra de mercado só tem gente pomposa. Policiais adoram aparecer para gente pomposa”
“Sei não, senhor”
“Tem filhos?”
“Quatro filhos. Só uma menina, senhor”
“Precisa de vassoura?”
“Não, senhor”
“Porra! Só sabe dizer não!!”
“Não, senhor. Vi o leite condensado e os iogurtes”
“Sei. Não quero saber o que viu. Quero saber como e porquê roubou”
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O rapaz mantinha-se em silêncio. Freitas chamou o escrivão. Perguntou se a ocorrência tinha sido feita, ele disse que não havia aberto o boletim ainda. Freitas pergunta se a mulher que foi roubada estava na delegacia ainda, ele diz que ela foi embora. Delegado Freitas pega o sujeito pelo colarinho, passa por toda delegacia carregando o marginal com uma única mão. Saem da delegacia, atravessam a rua. O delegado solta o rapaz, diz para ele nunca mais aparecer no mercado. Se ver a cara dele na delegacia vai arrancar seus testículos. O rapaz assustado, com uma mistura de alegria, some no meio da cidade.
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Passado o plano, todos estavam decididos que pegariam o dinheiro de Maciel. Mais de um milhão era a previsão de caixa para o sábado. Touro tinha caído como uma luva para os planos de Camargo. Vai ser o dia que vai rolar mais dinheiro naquela pocilga. Daniel também se sente eufórico, tinha contribuído e muito com seus rascunhos sobre o sistema de segurança do Local. Camilo ficou sabendo que Toninho estava tomando conta dos negócios, isso contribuiu ainda mais com sua vontade de pegar um dinheiro e ferrar com a administração do irmão. “Meu pai vai ficar orgulhoso de mim quando ver que meu irmão deixou uns delinquentes roubarem seu dinheiro!”.
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Camilo não participaria diretamente do roubo, mas sua presença no dia da luta era essencial. Ele era uma das pessoas que sabia o segredo do cofre, das outras portinholas que levava para a sala secreta onde Maciel guardava todo dinheiro das apostas. Daniel não entraria no Local, mas era a isca para tirar Toninho de circulação. Os seguranças só sabem obedecer ordens, quando faltava o comandante, todos ficavam perdidos, sem saber como agir; essa era a maior falha do Local.
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Camargo, Soraia e Daiane entrariam com Camilo no cofre. Murilo era o motorista que ficaria do lado de fora da casa. Alvarenga se encarregaria de tirar Toninho da sala, prometendo entregar-lhe Daniel. Camilo plantaria um boato entre os seguranças dizendo que Toninho estava fugindo com o dinheiro das apostas. Alvarenga pegaria Toninho, diria para Maciel que Toninho estava traindo o pai. Camilo assumiria o Local.
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17
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Sexta-feira. Um dia antes do roubo. Estavam analisando tudo, nos mínimos detalhes, nada podia sair errado. Camilo estava eufórico, mesmo sabendo que roubariam seu pai; tinha certeza que o dinheiro seria recuperado com novas lutas, principalmente se Touro conseguisse manter a façanha de ganhar as três lutas da noite. Daniel estava preocupado com Henrique, o prazo de pagamento da dívida vencia exatamente no dia que estavam querendo pegar o dinheiro de Maciel.
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Daniel pede para Camargo uma ligação. Tudo era controlado com mãos de ferro por Camargo, o mentor de tudo que estava sendo feita até o momento. Daniel diz que na verdade precisa falar com três pessoas. Camargo autoriza duas ligações, liga primeiro para Luiza.
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“Sim, estou bem”
“Eu cheguei na sua casa, vi que suas roupas não estão mais no guarda-roupa. E o dinheiro? O dinheiro também sumiu”
“Tive que fazer uma viagem. Vou pagar Henrique no Domingo. Você pode me encontrar?”
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Camargo fica atento com o que Daniel vai dizer. Era importante não dar nenhuma dica para ninguém de como seria o plano de fuga da quadrilha. Daniel diz que vai deixar o dinheiro na estrada que liga São Paulo e Campinas. Passou todos os dados para Luiza.
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“Para onde você vai? Onde você está agora?”
“Não importa. Só quero que saiba que te amo muito”
“Não desligue”
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Daniel desliga o telefone sem maiores explicações. Precisava falar com Cecília. A outra pessoa que queria ligar era Amanda. Estava preocupado com o presente, se Lucas tinha gostado ou não do presente. Amanda ficou fora dos planos. Camargo ligaria somente para Luiza. Era apenas um celular, e as outras pessoas também queriam ligações para familiares, amigos e amantes (no caso, Soraia).
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“Queria saber se pensou na minha proposta?”
“Não posso ir com você”
“Você me ama?”
“Claro que amo”
“Não ama. Viria comigo”
“Não quero deixar minha mãe, ela está doente”
“Leve sua mãe. Tenho dinheiro”
“Desiste logo desse negócio”
“Não posso desistir agora”
“Por mim?”
“Não fez nada por mim”
“Vamos ficar querendo provas um do outro em relação ao amor?”
“Sim. Você não viaja comigo, e eu não desisto do roubo”
“Viajo com você para outro lugar”
“Tarde demais agora”
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Delegado Freitas pega os sujeitos do acampamento clandestino perto do Colégio Franco Aguiar. Marinho é preso com uma enorme quantidade de drogas. Topeira tenta fugir, mas leva um tiro na perna. As mulheres e o outro ladrão conseguem sumir no meio do mato (Ainda estão sendo procurados pela polícia). Marinho leva uma surra na cadeia, todos sabem que ele trabalhava para alguém mais poderoso. Revela o nome do Maciel, com mais umas pancadas diz exatamente onde era o Local. Camargo não esperava que o Delegado Freitas conseguisse dar continuidade nas investigações. Soubesse teria matado naquele dia o sujeito que era responsável pela contratação dos lutadores entre os mal-afamados. Marinho era a única ligação dos negócios ilícitos de Maciel que havia sido descoberto até então.
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18
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Touro está sendo preparado para a luta. Para Toninho era essencial que Touro ganhasse todas as lutas de hoje. Duas mulheres japonesas fazem massagem naquela montanha de músculos. Francisco nunca imaginou uma vida daquelas quando veio de carona para São Paulo. Leite, queijo, frutas no café da manhã. Duas da tarde uma feijoada. Um lanche rápido quatro horas. Banheira, sauna e outras regalias de pop-star. Touro recebe instruções de um treinador de boxe contratado especialmente para aquele dia. Touro não precisava de instruções, precisa sentir ódio.
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Toninho entra na sala onde Touro está deitado. Maciel tinha acabado de sair dali com ar de satisfeito. Por instantes tinha esquecido de como era os carinhos de Alvarenga ao se defrontar com a brutalidade do novo herói dos gladiadores urbanos. Toninho entra na sala, com ele mais seis seguranças. Era preciso de todo esse exército para que Touro não estrangulasse Toninho depois que ficasse sabendo da proposta que seria revelada.
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A mãe de Touro estava presa numa sala ao lado. Touro levantou-se da cama, estava completamente nu. Toninho se afasta, fica com medo do que Touro pode fazer com ele. Toninho continua, diz que a Dona Iracema tem apenas uma chance de sobreviver, Touro precisa ganhar todas as lutas. Era fácil motivar um troglodita como aquele, o ódio em sua cabeça. Fechou os punhos, quebraria todos aqueles sujeitos e arrancaria todos os ossos daquele magrelo na sua frente. No entanto, apesar dos músculos, Touro também tinha um cérebro que raciocinou a impossibilidade de sair vivo daquele lugar caso cometesse alguma loucura contra Toninho. Sentou-se e continuou tomando seu suco de laranja.
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“Bom garoto! Assim que gosto dos vencedores!”
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Local estava cheio. Como havia previsto Camargo, a luta de Touro estava chamando atenção de muitas pessoas. Soraia e Daiane eram ring girls das lutas intermediárias, quando não estavam no ringue, divertiam alguns clientes. Alvarenga estava com Maciel, que não sentiu sua falta em nenhum desses dias. Murilo em ponto estratégico, aguardava ordem de Alvarenga para se aproximar. Camargo como segurança, tomava conta de um dos corredores que dava acesso às várias outras entradas secretas, onde numa delas estaria o cofre. Não foi difícil para Camilo saber onde estava o dinheiro estava guardado. Daniel do lado de fora aguardava a chegada de Alvarenga, Toninho e possivelmente alguns capangas.
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Lucas chora sem parar no quarto. Amanda entra correndo, não sabe o que está acontecendo com o filho. Ele teve um pesadelo, explica para a mãe. A mãe passa a mão na testa do filho, dizem que é uma ótima simpatia para se espantar fantasmas. Lucas sonha com o pai, diz que estava sangrando na orelha. Os olhos estavam vermelhos, o pai não respondia seu chamado. Amanda acredita ser apenas um pesadelo, a influência no filho da ausência do pai. Cobre Lucas novamente, canta umas músicas bobas, como são todas músicas de ninar, Lucas dorme.
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Amanda corre para a imagem da santa que está em cima da geladeira e reza pela vida do filho, esquece-se do pai; que daqui a pouco precisará muito mais de ajuda divina.
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Cecília atende um rapaz que se feriu num acidente de carro, ela não cansa de pensar em Daniel. Seria correto aceitar a proposta do namorado e fugir com ele para o Uruguai? Aplica a injeção na bunda do acidentado, que esperneia de dor. E se Daniel fosse um bandido, como cansara de avisar Dona Celestina, mãe de Cecília? Ajeita o doente na maca, leva para a sala de radiografia. Tinha que tirar Daniel da cabeça, não era um bom sujeito. Cara metido com jogos de azar, dívida com bicheiro. Não pode ser coisa boa. Dá o remédio errado para o sujeito que ainda sente dor por causa da batida do carro.
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