quinta-feira, 2 de agosto de 2007

Briga de Foice (7,8 e 9)

7
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Alvarenga entra na sala de Maciel, senta-se no sofá preto de couro. Maciel se levanta, se aproxima de Alvarenga. Os dois conversam sobre o estado de Toninho. Ele está melhor, vai conseguir respirar normal dentro de algumas semanas. Maciel diz que não consegue perdoar Daniel, Alvarenga faz um carinho na cabeça dele dizendo para pensar melhor antes de cometer alguma injustiça.
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“Você também está defendendo aquele rapazola?”
“Não é isso. É que ele estava fazendo o trabalho dele”
“Uma ova!”
“Já pensou se Toninho acerta um tiro no Paes? Que merda ia ser?!”
“Foda-se o Paes!”
“Precisa pensar melhor no dinheiro. Hoje a casa está cheia porquê aqui nunca houve confusão”
“Pode ser”
“Ainda pensa em acabar com Daniel?”
“Não. Por enquanto, não”
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Cecília acorda cedo. Sabe que Daniel não está brincando quando mandou que ela saísse de casa. Ela arruma as coisas, duas sacolas cheias de roupas. Sai sem que Daniel perceba. Ela odiava despedidas, sabia que Daniel também mudaria de idéia e a convenceria a ficar. Daniel acorda, percebe que Cecília não está na cama. Não sente também o cheiro do café. Tentou dormir novamente, mas não conseguia. Sentiu um aperto no coração, um vazio. Estava sozinho naquela casa. Quis chorar, mas seu orgulho impedia que essa vergonha acontecesse. Pensou melhor, era impossível mantê-la naquele lugar, Maciel poderia mudar querer matá-lo, isso era perigoso.
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Daniel pega o pacote de dentro do guarda-roupa. Conta mais uma vez o dinheiro, tem certeza que está faltando mil e trezentos. Pega o telefone, liga para Camargo. Não fala do dinheiro, de ter sido roubado por Maciel. Diz para Camargo que precisa de dinheiro, estava sendo pressionado. Camargo acorda assustado quando o telefone toca, Daniel diz claramente que precisa de três mil o mais rápido possível. Camargo sorri, um sorriso triste, sabe que Daniel deve dinheiro ao Henrique. Combinam um encontro, Camargo tem um serviço que vai render muito dinheiro.
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Luiza bate na porta assim que Daniel desliga o telefone. Luiza entra. Eles se beijam, Luiza diz que está com saudade. Daniel mantém-se calado. Luiza diz que a visita foi a mando do Henrique, ela diz que não consegue mais arrumar desculpas pela falta do dinheiro. Os dois se sentam no sofá. Daniel pega um copo de água gelada, diz que está com medo de morrer.
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“Precisa dizer para ele que surgiu um novo trabalho. Com o Camargo” – Daniel começa.
“Ele já fez muito por você. Não sei se vai conseguir acreditar que pagará a dívida”
“Eu sei. Eu sei, andei enrolado esses dias. Tenho um dinheiro comigo, pode levar para ele”
“Ele quer os três mil!”
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Daniel levanta do sofá, vai até quarto e pega o pacote de dentro do guarda-roupa. Entrega o pacote na mão de Luiza. Ela pergunta quanto tem naquele pacote. Mil e duzentos. Ela ri, joga o pacote na mesa, diz que não vai passar vergonha na frente de Henrique, não levará o pagamento. Daniel abraça Luiza. Os dois se olham, se beijam. Luiza pode conseguir mais um dia, nem ela sabe o poder que tem sobre Henrique. Daniel está vivo pois Henrique não quer ver Luiza distante. Daniel e Luiza transam.
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“Você está com gosto ruim na boca” – Luiza diz depois de tudo.
“Gosto ruim?”
“E um perfume horrível”
“Perfume?”
“De enfermeira vadia”
“Ela já foi embora”
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8
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Luiza se levanta do sofá, seu corpo nu desfila pela casa. Seu corpo é perfeito. Costuma fazer exercícios todos os dias, não come carne nem bebe refrigerante. Sua arma para conseguir tudo na vida é o corpo, quer sempre mantê-lo maravilhoso. Cabelos longos, pretos; lábios sempre bem pintados, grossos; uma voz suave que não diz um só palavrão. Mulheres têm dificuldade da elegância nos dias de hoje, ela não. Levanta-se, pega um copo de água; se aproxima de Daniel, se beijam. Ela se afasta, pega a roupa que está jogada no chão, veste-se. Camisa branca, mini-saia preta. Ela não usa meias para corrigir os defeitos naturais da perna, ela não tinha defeitos. Tira da bolsa um pequeno vidro de perfume: borrifa no peito, no pescoço e nas pernas. Pega o pacote de dinheiro que está na mesa, diz para Daniel que vai tentar convencer Henrique.
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Daniel toma banho, está atrasado para o encontro com Camargo. Veste-se apressadamente, coloca a arma na cintura. E a mesma arma que roubou de Toninho no dia da briga. Dessa vez ele não sai de moto, prefere não se arriscar. Ônibus cheio de gente é o local perfeito para não ser alvo de Maciel. Entra no ônibus, curiosamente não está cheio, apesar do horário. Olha em volta, não percebe nenhuma ameaça. Senta-se ao lado de um velho, o homem está fedendo. Ele não se importa, já ficou do lado de coisa pior nessa vida. O velho abre o jornal, está lendo sobre futebol. Depois para a política. Daniel continua quieto, pensando o que será do seu futuro.
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“Qual o seu candidato predileto?” – O velho fechando o jornal, dirigindo-se ao Daniel.
“Não tenho candidato”
“Você está nervoso?”
“Não, meu senhor. Não estou nervoso”
“Por quê carrega uma arma, então?” – Daniel percebe que o revolver está aparecendo na altura do umbigo.
“Policiais andam armados sempre” – Daniel ajeitando a arma.
“Você tem mais cara de bandido”
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Daniel continua olhando pela janela, o velho se desinteressou por ele. A paisagem sempre é a mesma, mas algumas pessoas novas vão aparecendo pelo caminho. Quanto tempo levaria para chegar ao centro da cidade? Camargo não é sujeito que gosta de esperar, logo fica bravo e vai embora. Pior para Daniel, ele quem mais precisa desse encontro, pelo menos é o que ele pensa.
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“Para quem você vai torcer?” – O velho novamente.
“Já disse que não gosto de política”
“Estou falando de futebol. Que time você torce?”
“Não gosto de futebol”
“E de mulher? Você gosta?”
“Que pergunta”
“Quando eu era catador de papelão eu tinha várias mulheres”
“......”
“Agora que sou faxineiro, vivo sozinho”
“Vai aparecer alguém para você, tenha certeza”
“Eu moro numa pensão na Sé”
“Desço aqui”
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Daniel continuou andando, entrou na padaria conforme combinado com Camargo. Sentou-se na terceira mesa do lado esquerdo de quem entra. Um cinzeiro, uma cerveja e um copo. Camargo está aqui, ele pensa. Deve ter ido ao banheiro. Não se pode largar copo cheio na mesa, é perigoso para golpes. Sentou-se, garçom lhe trouxe um copo. Duas mulheres ao seu lado estão almoçando, era tarde para almoço. Dois homens conversam no outro canto, estão bebendo. O cheiro de comida está enjoando Daniel, ele fica incomodado aguardando Camargo. O plano podia ser em relação ao Henrique, Camargo também deve dinheiro ao bicheiro. Poucos policiais não fizeram dívidas com Henrique. Camargo chega, põe cerveja no copo. Pede uma porção de fritas ao garçom.
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“Você bebe um copo?”
“Não. Já bebi demais esses dias. Me chamou aqui para o trabalho no colégio Franco Aguiar?”
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9
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Camargo se ajeita na cadeira, estava eufórico para contar o plano ao Daniel. Sim, queria acabar com os malandros da Franco Aguiar, mas não era para isso que tinha marcado aquele encontro.. Matar aqueles bandidos era serviço humanitário, ele pensou. Camargo diz que é um plano novo, Daniel é peça chave; valia muito dinheiro. A porção de fritas chega, Daniel fica mais enjoado ainda. Camargo espalha catchup no prato, come uma batata. Joga mais sal. Bebe um gole da cerveja.
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“Não é sobre os vagabundos que quero falar”
“Pensei que queria matar aqueles sujeitos”
“Não tenho pressa. É pior acabar com eles agora”
“Delegado Freitas está de olho em você?”
“Sim. Está querendo me pegar, mas não vai conseguir”
“Que pretende?”
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Ele se curva na cadeira, como querendo falar com Daniel em segredo. Se aproxima do ouvido do amigo.
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“Quero armar um esquema no Local”
“Porra! Ficou doido?”
“Calma, vou explicar”
“Nem quero saber”
“Calma, já disse. Está armado, tem um pessoal com a gente”
“Não sei”
“Vou contar, se quiser pode vir conosco, se não quiser pode cair fora”
“Conte”
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Uma das moças que estava almoçando se aproxima de Daniel e Camargo. Ela senta na cadeira, o garçom bota um copo na mesa. Camargo enche o copo da garota de cerveja. Camargo apresenta a moça como Soraia. Os três começam a conversar sobre o plano. Camargo se levanta, diz que está apertado. Daniel e Soraia continuam conversando.
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“O que achou do esquema?”
“Bom. Mas é loucura fazer isso com Maciel”
“Você pensa pequeno, já me disseram. Tem medo”
“Onde conheceu Camargo?” – Daniel coloca mais bebida no copo da garota.
“Na noite. Não dá para saber direito. Só sei que nos tornamos amigos, na cama”
“São namorados?”
“Tenho cara de namorar?”
“Não”
“Gosto mesmo é de pica!” – Solta uma risada histérica.
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Camargo chega. Ele está trazendo uma outra cerveja. Diz para Daniel pensar bem no caso, sabia que precisava de dinheiro. O plano realmente era arriscado, roubariam o Local. A noite já tinha chegado quando Daniel saiu da padaria. Estava pensando no caso, se aceitava ou não a proposta. Não disse nada ao Camargo. Chega em casa, deita-se no sofá. A casa está escura, prefere que continue assim. Luiza chega, abre a porta, entra sem fazer barulho. Percebe que Daniel está dormindo, cobre Daniel. Vai até a cozinha, prepara alguma coisa para comer. Deita-se no outro sofá, dorme,
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Touro entra no rinque. Ele decide por mais uma luta. Era a terceira que faria naquela noite. Nunca um lutador conseguiu passar da segunda luta numa noite. O prêmio estava depositado na sua conta, o segundo na conta de sua mãe. O terceiro cheque estava em poder de um dos seus irmãos, era a garantia caso ele morresse. Maciel mesmo quem preencheu o cheque. Disse pessoalmente que Touro era um homem de coragem. A luta começa.
(Continua.....)
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Um comentário:

Neisa Fontes disse...

E tá esquentando o caldeirão!!!
Estou apreciando demasiadamente o romance!